Regras brandas atraem viajantes ao balneário, que equilibra protocolos e estímulo à economia

Felipe Bächtold (Folhapress)

Pelas ruas de Cancún, um dos destinos de praia mais famosos do mundo, os ônibus ainda circulam com mensagem que diz: "Fique em casa, por favor".

Em um único dia de meados de agosto, porém, cerca de 120 mil turistas de diversos países enchiam os hotéis, aeroporto, bares e praias da região, sob o sol escaldante do verão do hemisfério norte, às margens das águas paradisíacas do Caribe mexicano.

Grande vitrine turística do México, o balneário adotou uma forte estratégia para retomar a atividade, responsável por 80% de sua economia, ainda no início da pandemia da Covid-19, em 2020.

Depois de meses de fechamento de seus estabelecimentos e um prejuízo bilionário, o setor turístico foi declarado atividade essencial pelo governo estadual em junho de 2020, o que permitiu a reabertura gradual e com capacidade reduzida.

A retomada também contou com uma política muito mais benevolente de controle de fronteiras do que em outros países, e o turista brasileiro foi um dos alvos prioritários para alavancar a retomada da economia local.

Para se entrar no México, não é preciso apresentar teste de Covid, nem fazer quarentena ou mostrar comprovante de vacinação. Basta passar por controles protocolares de medição de temperatura e preencher um questionário ao transitar pelo país.

A partir de dezembro, um voo da Aeroméxico fará, durante a temporada de férias, a ligação direta entre Guarulhos (SP) e Cancún, atendendo a uma reivindicação antiga do setor turístico local.

A expectativa é de que 2021 supere o pré-pandêmico 2019 em volume de turistas do Brasil no Caribe mexicano –mais de 180 mil, segundo dados das autoridades regionais. "Brasileiros têm sido muito importantes. Depois de um ano tão complicado, a chegada deles compensará outros que não puderam vir", diz a prefeita Mara Espinosa.

Quando questionadas, as autoridades locais sempre afirmam que é seguro promover o turismo seguindo os protocolos sanitários, e que os contágios entre viajantes testados são muito poucos. A área turística de Cancún, situada em uma única avenida costeira de cerca de 20 km, é literalmente uma ilha, afastada das partes mais populosas.

Mas toda a região permanece ainda atualmente na chamada fase laranja da pandemia, o segundo grau de risco em uma escala que vai até a fase vermelha e impõe restrição à reabertura, como limite de capacidade dos estabelecimentos comerciais.

A promoção de atividades turísticas dentro da conjuntura de pandemia provoca cenas de certa forma inusitadas, como quiosques de testes de Covid dividindo, nas calçadas de Cancún, o espaço com barracas de camelôs e tendas de vendas de passeios.

Os trailers dos laboratórios estão por toda parte porque os demais países exigem a apresentação de teste negativo do turista que retorna. Essa regra é aplicada inclusive pelas autoridades brasileiras, que cobram o teste negativo de PCR de quem volta para casa.

Caso o turista seja diagnosticado com o coronavírus, é impedido de embarcar e precisa ficar em quarentena, em um nada desprezível risco de perrengue em solo estrangeiro. Os hotéis do balneário passaram a ofertar, então, uma espécie de seguro-quarentena, no qual, mediante uma taxa de poucos dólares, o turista que receber o diagnóstico de Covid pode estender a sua estada por um preço bem inferior ao cobrado normalmente.

Nesse caso, o hóspede não pode sair do dormitório, nem receber o serviço de quarto –apenas a entrega das refeições. Os hotéis dizem que são situações pouco frequentes. Na área turística de Cancún, o exame PCR custa a partir de US$ 90 (cerca de R$ 470) e deve ser feito nas 72 horas que antecedem o embarque de volta ao Brasil. É altamente recomendável comprar um seguro-viagem. Sem ele, caso necessite de atendimento médico, o viajante pode ter como única opção o sistema público local. Também é aconselhado verificar as condições do seguro. Uma hospitalização na rede privada mexicana, se prolongada, pode exceder os valores da cobertura.

Pela localidade caribenha, o clima é um pouco de "velho normal", com seus shoppings de luxo, suas praias praticamente privativas para os grandes hotéis e ainda resorts no melhor estilo bon vivant, que instalam na areia camas com colchão de couro e dosséis.

Mas ainda há atividades funcionando parcialmente ou mesmo suspensas. Alguns serviços oferecidos por spas, por exemplo, e petiscarias na beira das piscinas, não estão disponíveis por segurança.

Outro efeito da Covid que ainda persiste é em um dos principais atrativos, o da agitada vida noturna. As baladas, divulgadas pela cidade como "melhores do que em Las Vegas", não podem abrir na fase laranja. Como alternativa, funcionam como restaurantes.

De qualquer forma, no miolo da zona turística, a movimentação à noite é intensa, com bares com dançarinas tocando música alta para chamar a clientela. Tudo precisa fechar até a meia-noite.

Os turistas americanos, vasta maioria do público viajante em Cancún, são criticados entre os moradores pela negligência no uso de máscaras. Com o avanço da vacinação, a obrigatoriedade da proteção nos EUA foi flexibilizada. Em Cancún, o uso continua obrigatório, exceto nas praias.

"Muita gente quer ficar nos lugares que estão cheios, não respeitam as medidas sanitárias. Tem uma ideia de que, como tem a vacinação, não vai acontecer nada", diz o morador Said García, 31, funcionário de um laboratório.


Arredores podem mesclar ecoturismo, história e esportes aquáticos


Quem vai à região de Cancún e pretende não ter apenas uma breve estada pode planejar um intervalo na badalação com passeios aos arredores. Um clássico são as excursões aos cenotes, labirintos aquáticos subterrâneos considerados sagrados na civilização maia. Eles são uma das grandes atrações da península Iucatã, onde fica Cancún, atraindo pesquisadores de diversas partes do mundo também pela busca arqueológica e paleontológica.

Na tradição maia, esses rios serviam a rituais de renovação e purificação, além de abrigar partos e sepultamentos. As descobertas ainda estão em andamento: são milhares de cenotes pela região e tantos outros que ainda não foram identificados.

A reportagem esteve em um descoberto há apenas 18 anos, e posteriormente transformado em um parque privado, chamado Kantun-Chi. Conta com um conjunto de piscinas naturais, subterrâneas ou não, de água límpida –mas geladíssima.

O passeio começa com uma descida de escada a uma espécie de poço que dá acesso ao primeiro "salão". Embaixo da terra, há uma profusão de estalactites ("cones" de rocha presos ao teto) e estalagmites (presos ao chão).

Deve-se manter toda a cautela ao percorrer as águas para evitar arranhões nas rochas. Em alguns momentos, os túneis são tão estreitos que requerem algum esforço para transpô-los. O passeio é contraindicado a claustrofóbicos. Também na linha Caribe não convencional, uma alternativa é a visita a Chichén Itzá, sítio arqueológico da civilização maia mundialmente conhecido pela sua pirâmide.

O local, que abrigou o centro cultural e político dos maias até o século 13, fica a cerca de 200 km de Cancún. Agências de turismo cobram o equivalente a cerca de R$ 600 por um passeio de um dia, além da opção de visitar um cenote da região.

De volta à praia, é recomendável reservar ao menos um dos dias do roteiro para visitar a Ilha Mulheres, de sete quilômetros de extensão e que conta também com resorts e parques aquáticos.

Uma opção mais barata, em vez de contratar um passeio com agência de turismo, é fazer a travessia em ferry-boat, por US$ 21 ida e volta. No parque Garrafón, é possível praticar atividades como mergulho de superfície, tirolesa e passeio de caiaque.

Na ilha, também vale para contemplação a caminhada até o Acantilado del Amanecer, um trecho de penhascos à beira do mar onde fica seu ponto mais ao sul. Povoado por onipresentes iguanas, o Acantilado ainda inclui ruínas de um pequeno templo dedicado a cultuar a deusa maia da fertilidade.

O jornalista viajou a convite da Aeroméxico, do Conselho de Promoção Turística de Quintana Roo e do Grupo Posadas*