Longe da aglomeração, gente do mundo todo busca alento pegando onda, fazendo ioga ou comendo melancia às 5h
Por Marcelo Salinas
Os dominicanos chamam Cabarete de "a capital caribenha do surfe". O título soa como um daqueles que cidades dão a si próprias para promover o turismo, como "capital mundial da pamonha" ou "capital brasileira do ovo".
No entanto, quando se avista o mar de Cabarete, uma cidade de 14 mil habitantes na costa norte da República Dominicana, percebe-se que a distinção faz sentido. A temporada de furacões e tempestades tropicais transforma o vilarejo caribenho em um paraíso para surfistas.
De junho a novembro, furacões são corriqueiros e celebrados pela comunidade local, que vive do turismo de surfe, kitesurfe e windsurfe. Tempestades brindam visitantes e moradores com ondas de até três metros e raramente atingem a costa.
O destino fica na província de Puerto Plata, a quatro horas de carro ao norte da capital, Santo Domingo.
As estradas são bem pavimentadas e há sinal de GPS em quase todo o percurso.
Para quem faz o trajeto de carro, é possível notar campinhos de beisebol aqui e ali. Mesmo nos vilarejos mais pobres, a criançada pratica o esporte bem paramentada: uniforme, boné, chuteiras, capacete e luva de couro.
Parece um esporte caro para um país pobre, e de fato é. A economia da República Dominicana, porém, é mais próspera do que se imagina para um país que faz divisa com o Haiti.
Segundo o Fundo Monetário Internacional, o Produto Interno Bruto per capita dominicano, de US$ 18.783 em 2020, é 29% maior que o brasileiro –US$ 14.563.
Essa relativa prosperidade é visível em Cabarete. A infraestrutura para o turismo é boa, e há oferta variada de comércio e serviços. A cidade hospeda condomínios imponentes e, nos bairros pobres, as casas parecem dignas e bem conservadas. Parte da população é estrangeira, formada por europeus e americanos. A maioria migrou em busca do sonho caribenho de passar invernos bebendo piña colada na praia.
O que faz de Cabarete a capital caribenha do surfe é a Encuentro Beach, o principal destino de surfistas no país. É nela que as forças da natureza premiam visitantes com ondas perfeitas e tubulares.
No Caribe não existe praia feia. As de Cabarete não são exceção: são tão paradisíacas quanto as irmãs famosas.
O que torna a Encuentro especial é, justamente, ser menos notória. Fica a sete quilômetros do centro da cidade, distância suficiente para possibilitar a tranquilidade de surfistas e banhistas.
Se as praias de Punta Cana são uma Disney de resorts e cassinos abarrotados de turistas, a Encuentro é o oposto. A pequena comunidade é uma confluência de tribos ligadas à vida saudável e à cultura "paz e amor".
Às cinco da manhã já tem gente pegando onda, fazendo ioga ou comendo melancia.
A praia é extensa e, mesmo antes da pandemia, praticamente deserta. O ponto de encontro consiste em um bar pé na areia, uma galeria de arte e quatro escolas de surfe.
Mesmo disputando ondas com surfistas nativos em dias concorridos, os forasteiros costumam ser bem tratados. No mar, há desavenças como em qualquer pico de surfe, mas é raro ver alguém saindo no tapa por causa de uma onda. Ou, ainda, chamando turistas de "haoles", ou intrusos, como acontece em mares brasileiros. O que acontece é o contrário: as pessoas são receptivas e o ambiente é propício para fazer amizades.
Tanto no mar como na areia dá para conhecer gente do mundo todo. Cada morador tem sua história inusitada de busca pelo sonho caribenho.
Um sujeito, já nos seus 50 e tantos, só andava descalço havia seis meses. Era advogado nos Estados Unidos e dizia ter sido colega do ex-presidente americano Barack Obama em Harvard.
Uma ex-modelo e ex-moradora do Alasca vivia de surfar e vender biquínis. Outro americano –banqueiro falido e um dos responsáveis pela crise financeira de 2008– mudou-se para mergulhar e mapear cavernas submarinas. Não parecia falido, contudo.
O mar da Encuentro tem fundo de pedra e cinco trechos com características próprias de arrebentação. Com exceção do La Derecha, um trecho mais constante, e da área para iniciantes, surfar nos demais requer experiência. Nos trechos Coco Pipe e Destroyer as ondas são maiores do que aparentam da areia. Pode ser a onda mais perfeita ou o caixote mais constrangedor da sua vida.
Nas escolas de surfe é possível alugar pranchas boas e variadas por US$ 20 (R$ 107) a diária. Se estiver sozinho, vale a pena contratar um instrutor nos primeiros dias para se enturmar. Prefira uma escola com instrutores dominicanos: conhecem o mar e a comunidade como poucos.
Se planeja embarcar depois da pandemia e a ideia for farra, considere ficar no centro de Cabarete. Se pretende viajar durante a pandemia, hospedar-se próximo da praia Encuentro é a melhor opção. Há menos vagas mas quase nenhuma aglomeração.
A moeda local é o peso dominicano. Porém, a referência para os dominicanos é o dólar. Uma refeição sem extravagâncias sai por 500 pesos, pouco menos de US$ 10 ou R$ 50. Estime gastar, no mínimo, R$ 300 por dia em hospedagem. Durante a pandemia, há acomodações bem localizadas nessa faixa de preço, como Natura Cabana, Surfbreak Cabarete e El Encuentro Surf Lodge.
O país aceita brasileiros, não exige teste negativo de Covid-19 para admissão e, com alguma antecedência, é possível comprar voos de ida e volta por R$ 3.500 ou menos. O uso de máscara é obrigatório e há álcool em gel na maioria dos estabelecimentos. Se for alugar um carro, tome cuidado com os motociclistas. Eles respeitam as normas sanitárias e usam máscara. O que não usam é capacete.