Promoção internacional do Brasil necessita de uma reflexão
Por Cláudio Magnavita*
A promoção internacional do Brasil necessita de uma reflexão. A primeira delas é uma profunda revisão do Plano Aquarela, que norteia as ações internacionais da Embratur e foi desenvolvido pelo consultor catalão Joseph Chias em um mundo que mudou radicalmente nos últimos oito anos. O próprio Chias já não está mais entre a gente e nestes anos também perdemos a Varig, a Europa entrou em crise, os Estados Unidos sofreram um colapso econômico e o real valorizou.
No relançamento do Plano Aquarela, realizado há alguns anos no Hotel Intercontinental (que já virou Golden Tulip), o superintendente do Rio Convention & Visitors Bureau, Paulo Senise, não escondia a insatisfação pela falta de uma consulta aos atores do turismo internacional do País. O plano, que foi lançado com vários vícios de origem, chegou de cima para baixo, sem ouvir e debater com ninguém. O diálogo, se houve, foi pífio. Só para inglês ver.
Uma das maiores sandices foi reduzir gradativamente a visibilidade do Brasil nas Feiras Internacionais de turismo e adotar os workshops como prioridade. Entre os erros de origem e que por si só definem o fracasso do modelo do Plano Aquarela, está o fato de que na sua elaboração a realização da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016 eram peças de ficção. A conquista da Copa e da Olmpíada obrigaria uma mudança radical de postura. O jogo, sem trocadilhos, passou a ser outro.
Se a "bíblia" que a Embratur deve seguir é falha, o que deveria ser feito, em ritmo de mutirão, era um chamamento amplo para que todos os setores envolvidos no turismo internacional participassem do planejamento emergencial para uma nova postura do Brasil no mundo.
O atual presidente da Embratur, Flávio Dino, é um dos melhores ouvintes que o setor público já teve e ele teria sensibilidade para promover esta jornada em tempo recorde. Ele tem autoridade moral para agir com mão firme e impor o papel da Embratur a outras esferas do Governo. Possui uma boa equipe e uma estrutura de marketing eficaz, que pela primeira vez profissionalizou as ações, inclusive com planejamento. Os problemas maiores são criados por agentes externos.
Os problemas que o Brasil enfrenta na promoção internacional estão consolidados, ou melhor, encruados de forma danosa dentro do próprio Governo. É necessária uma mobilização da própria sociedade para que o Governo Federal acorde e passe a priorizar o turismo que gera receita em moeda forte e que ajude equilibrar a nossa balança comercial neste setor, hoje altamente deficitária.
Entre os pontos que devem ser colocados na ordem do dia estão alguns itens que seriam óbvios em um país regido pelo bom senso e pela lógica. Um exemplo gritante é o papel secundário que o turismo ocupa na condução da presença brasileira nas Olimpíadas de Londres. Já agora, em 2012, o Brasil passa a ser o guardião da chama olímpica de 2016. O orçamento da Embratur para Londres deveria ser, pelo menos, dez vezes maior ao que será investido na realidade.
O conflito de egos que envolve Comitê Olímpico Brasileiro, Itamaraty, Ministério dos Esportes, Secom, Governo e Prefeitura do Rio coloca o turismo como coadjuvante neste processo. Nem mesmo o setor oficial nos diferentes níveis (Prefeitura, Estado e Governo Federal), conseguiu definir uma agenda única que surpreendesse. Cumprirá simplesmente tabela. Nada que realmente surpreenda deverá ser realizado. A sensação é que começamos a desperdiçar uma grande oportunidade.
O que ocorreu em Johanesburgo deveria servir de exemplo do que não fazer. Na África do Sul, na Casa Brasil, foram gastos valores astronômicos com resultados incipientes. Se o TCU (Tribunal de Contas da União) colocasse a lupa dos gastos consolidados em tudo que foi investido por diferentes órgãos do Governo Federal, o caso terminaria em CPI. O botequim que o Rio montou por lá fez mais sucesso e teve mais público do que a Casa Brasil. O Rio gastou apenas uma ínfima parte do que foi torrado pela União.
O maior erro nesta ação foi gastar uma fortuna sem ouvir o setor do turismo e transformar o evento em palco político e para justificar milhões. Parece que quanto menos publicidade tivéssemos, seria melhor. Até hoje não houve um balanço consolidado de todo o dinheiro aportado.
A sensação é que perdemos uma oportunidade de ouro para iniciar a promoção do Brasil utilizando a Copa do Mundo. Mais uma vez os atores do turismo não foram chamados para opinar. O problema, muitas vezes, não é de orçamento, mas de como são gastos os recursos.
Outra oportunidade perdida é a questão do visto. O próprio presidente dos Estados Unidos foi à Disney e anunciou uma ação para aumentar o número de visitantes brasileiros para os EUA. Falou na flexibilização de vistos e numa política para facilitar o acesso de quem quiser gastar dólares na terra do Mickey. Fizemos olhar de paisagem à ação do Obama. Nada de concreto foi realizado para que o nosso Governo agisse da mesma forma e tentasse atrair os dólares americanos. Parece que temos orgasmos quando obrigamos um americano a peregrinar para tirar um visto ou quando barramos turistas espanhóis nos aeroportos, sempre em nome de uma reciprocidade vaidosa.
O Governo possui no Medic, a Apex, que na atuação internacional age de forma independente. O diálogo entre Apex e Embratur praticamente não existe. A sinergia entre a agência de promoção à exportação e Embratur deveria ser de irmãos siameses. Os dois órgãos de Governo estão de costas viradas um para o outro.
A TAM está em processo acelerado de fusão com a chilena LAN. As bases internacionais da empresa brasileira, que a exemplo da Varig eram máquinas de vender o Brasil, passarão para mãos chilenas. Corremos o risco de perder uma estrutura de gerar vendas para o Brasil no exterior e nada fazemos. Nesta hora não há intesses nacionais a serem defendidos.
Perdemos a rede internacional de vendas da Varig e ninguém reclamou do prejuízo que o turismo teria. Anos depois, por ironia do destino, em uma reunião para elaborar o Plano Nacional de Turismo, um representante da Embratur justificou este como um dos motivos que patinamos nos 5 milhões de turistas internacionais ao fim da Varig. Tivemos a sorte de ganhar uma nova empresa aérea de bandeira e agora entregamos ao Chile. Não há no Governo nem uma voz que peça uma salvaguarda.
Na aviação temos a nossa coluna vertebral das ligações aéreas do Brasil com a Europa, que é a TAP, entrando em um processo irreversível de privatização. Mais uma vez ninguém reclama uma posição mais forte do Governo Federal em estimular a presença de empresários brasileiros ou é timida a reação pública de preocupação.
Estamos fazendo a privatização dos aeroportos em nome de Copa e de Olimpíada e novamente o turismo não é ouvido. Se os preços dos serviços aeroportuários dispararem e afugentarem as companhias aéreas, sentiremos os efeitos. Não foi colocada nos editaias nenhuma proteção para que os aeroportos atraiam voos fretados internacionais. Turismo e aeroportos não fazem parte do mesmo mundo no Brasil.
* Cláudio Magnavita é presidente do Jornal de Turismo e membro do Conselho Nacional de Turismo