Como a aviação agrícola integra ações humanitárias das Nações Unidas, do Brasil e seus vizinhos sul-americanos contra um flagelo de tempos bíblicos que ainda hoje ameaça continentes com a fome
A praga que provocou o nascimento da aviação agrícola brasileira vem de tempos bíblicos e ainda hoje assola anualmente diversas partes do mundo. Porém, a história nos mostra que nuvens de gafanhotos passaram ser melhor combatidas depois que o homem aprendeu a voar. E, assim como no Brasil, naquele agosto de 1947, não por acaso ataques de gafanhotos também provocaram o início da aviação agrícola na Argentina, em 1926; no Uruguai, em 1941, e até na antiga União Soviética (mais precisamente na Ucrânia), em 1925.
Aliás, falando em Bíblia, em 2004 a própria imprensa israelense mencionou repetidas vezes a oitava praga citada no Livro do Êxodo, no Antigo Testamento. Só que ao contrário, quando gafanhotos saídos do Egito avançaram sobre o Estado Judeu. Na época, foi a maior infestação de gafanhotos desde 1959, combatida por pilotos agrícolas israelenses já na região de fronteira de seu país. O que acabou se repetindo em 2013 e com novos alertas nos anos seguintes.
Em tempos modernos, há duas principais zonas de controle de gafanhotos no planeta. Uma delas envolve a região atingida pelo gafanhoto do deserto (Schistocerca gregaria) – que cobre especialmente na África, Oriente Médio e Sudoeste da Ásia. A outra zona crítica é a do gafanhoto sul-americano (Schistocerca cancellata), cujas nuvens de insetos se formam principalmente na zona da tríplice fronteira entre Colômbia, Argentina e Paraguai – na região do Gran Chaco.
No caso do Velho Mundo, o controle e a mobilização de recursos têm anualmente ação direta da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (Fao, na sigla em inglês). Onde a aviação agrícola é fundamental para proteger alguns dos países mais pobres do planeta da praga migratória mais destrutiva do mundo. Considerando que o gafanhoto do deserto pode se deslocar 1 mil quilômetros em uma semana e onde uma nuvem de insetos pode consumir em um dia alimento suficiente para 35 mil pessoas.
Já na América do Sul, a principal referência no monitoramento dos insetos é o Programa de Gafanhotos do Serviço Nacional de Sanidade Agroalimentar (Senasa), da Argentina. O programa existe desde 1891, quando foi criado como Comissão Nacional de Extinção de Gafanhotos. Na verdade, o combate a gafanhotos está na gênese de todas as ações estatais de sanidade vegetal no país vizinho. Com a Argentina tendo registros de ataques de gafanhotos desde 1538, quando ainda era colônia espanhola.
Assim, não é à toa que apenas cinco anos depois da primeira operação agrícola do planeta (em 1921) nos Estados Unidos, o país vizinho já colocava a novidade em seu arsenal contra os insetos migratórios.
Historicamente, as grandes nuvens de gafanhotos surgidas no Gran Chaco normalmente se deslocam pela Argentina ao sabor das correntes de ar quente. Em alguns casos, chegando até a fronteira com Uruguai e Brasil. Foi o que ocorreu em 1946 e 1947, quando o Rio Grande do Sul enfrentou duas grandes infestações de insetos que entraram no Estado pelo sul – da Argentina, as nuvens entraram no Uruguai indo para leste e em seguida tomando rumo norte para o Estado gaúcho.
Situação que quase se repetiu em 2020. Quando, em junho daquele ano, uma nuvem de insetos percorrendo o território argentino chegou a pouco mais de 100 quilômetros da fronteira gaúcha. Colocando Rio Grande do Sul e Santa Catarina em emergência fitossanitária pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Fazendo com que o Sindag e suas associadas disponibilizassem aeronaves agrícolas de prontidão para o combate aos insetos, caso cruzassem a fronteira. E com a entidade aeroagrícola contribuindo também com a atualização do Manual de Procedimentos federal contra a praga e com o plano de ação do governo gaúcho em reposta a esse tipo de emergência.
No entanto, a nuvem que em junho de 2020 chegou perto da fronteira Argentina com o Rio Grande do Sul, foi extinta em 25 de julho com aplicações aéreas e terrestres no município de Federación, na fronteira com o Uruguai. Foi a primeira vez em mais de 70 anos que uma nuvem de insetos havia chegado tão perto do território brasileiro.
Isso, mais o fato que desde 2015 tem se registrado aumento na incidência de nuvens de insetos na América do Sul, levou o Senasa a promover um treinamento para técnicos de países vizinhos. A ação, ocorrida em dezembro do ano passado (aproveitando a “baixa temporada” dos insetos) teve apoio do Comitê de Sanidade Vegetal do Mercosul (Cosave) e contou com dois participantes do Rio Grande do Sul.
Amanhã: O avião do primeiro voo e a indústria
Por: Sindag - Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola