Ofuscados pela crise econômica estamos perdendo um dos mais importantes momentos da história brasileira 

A elite brasileira tem um histórico de desamor ao Brasil. Ao primeiro sinal de perigo migra na procura de um porto seguro no exterior. As favas o futuro do Brasil. Foi assim nas vésperas da eleição do Collor, quando o risco da vitória do “Sapo Barbudo” fez o boom imobiliário em Miami. Continue Lendo!

 Por Cláudio Magnavita*

A elite brasileira tem um histórico de desamor ao Brasil. Ao primeiro sinal de perigo migra na procura de um porto seguro no exterior. As favas o futuro do Brasil. Foi assim nas vésperas da eleição do Collor, quando o risco da vitória do “Sapo Barbudo” fez o boom imobiliário em Miami.  

“Quero ter uma casa, um carro na garagem e dinheiro no banco para recomeçar a vida” era um pensando recorrente de quem procurava abrigo na Flórida.

Ironicamente essa mesma elite abrigou o Collor no seu exílio em Coral Gables. Sempre foi a primeira a falar mal do país e dos seus governantes.

A insatisfação da classe média só foi amenizada quando houve a paridade entre o real e o dólar. Todos falavam maravilhas do Brasil. Miami ficou mais barata do que São Paulo! Um sucesso!

O que assistimos agora é essa classe média brasileira em um perigoso efeito mamada atirando contra o país. Invocam com tanto fervor a crise que ela se instala na justificativa de tudo. Muitos já pensam em ir para o exterior.

Rezamos uma secular cartilha de uma moral católica romana onde o lucro é pecado, na qual estamos fadados à miséria e não temos direito as conquistas ou vitórias.

Não há na mídia e nas rodas de conversa uma única palavra positiva ao período de transformação que estamos vivendo. Tudo é crise! Os avanços dos últimos anos somente evaporaram.

Somos incapazes de perceber, neste caos do gênesis, o novo Brasil que está nascendo. Um país que surge tutelado por instituições que respeitam o estado de direito. Por um sistema que respeita as investigações, que coloca na cadeia ex-ministros, ex-dirigentes de estatais, políticos e proprietários das maiores construtoras do país sem que haja um esboço de pressão ou intimidação as apurações dos mal feitos.

Estamos perdendo o espetáculo fantástico de transformação que está ocorrendo debaixo dos nossos narizes. Estamos expurgando um sistema que misturou há décadas o público e o privado. Que misturou o financiamento de campanhas milionárias com o enriquecimento ilícito de grande parte da classe política e de ocupantes de cargos públicos.  

O que foi revelado pela Lava Jato era do conhecimento público de todos os antenados.  A diferença é que agora as entranhas de um sistema podre estão sendo expostas em detalhes. A cada delação premiada revela-se “modos operantes” que fazia parte de pelo menos três gerações com proporções sempre crescentes.

Infelizmente o processo expurgo está sendo aproveitado por uma direita,também contaminada pelos mesmos pecados nas suas entranhas.  

A esquerda, ou melhor, o PT no poder (ou parte dele) desaba corroído por uma percepção criminosa que transformou milhão em trocado. Com um fluxo de negócios paralelos que inicialmente eram justificados como para manter o “partido” e que pouco a pouco migrou para as contas particulares dos nomes mais coroados: Pallocci, Dirceu e o enteado do Lula são hoje homens ricos. O mesmo ocorreu com outros inquilinos de palácios estaduais. O Eduardo Campos morreu em um jatinho ao qual se atribui a propriedade. No governo paulista o escândalo do Metrô. No

Maranhão, Flávio Dino revela os podres do Sarney. Se a caixa preta da Odebrecht for aberta não sobra ninguém para apagar a luz.

O processo eleitoral é totalmente podre. Mandato se compra e não mais se conquista. Quem fazia oposição no passado virou guardião de milhão.  

O que está ocorrendo no país é sensacional. Uma limpeza sem precedentes.

Ao demonizar a presidência da república estamos fazendo o jogo oportunista de inventar o terceiro turno.

A presidente Dilma é pessoalmente a fiel condutora da não intervenção da máquina do governo neste processo. Vai reconduzir Janot, mantém o governo distante do processo de apuração e deixa o judiciário soberano na faxina que realiza.

O deputado Eduardo Cunha, que fez campanha em um milionário helicóptero bi-reator, se tornou desafeto de Dilma acusando-a de abrir a caixa de pandora.

A firme postura de Dilma desagrada principalmente os aliados e companheiros pegos com a mão na cumbuca.  

Se o Aécio fosse o Presidente, dificilmente teríamos este DNA de isenção. O próprio histórico do senador o levaria a operação de abafa, a exemplo do que ele fez em Minas e do Governo FHC que entrou para história como o criador do “engavetador mór” da república.

O efeito teflon do Lula vem perdendo eficácia. Mas acusá-lo de receber doações do instituto Lula e de agir a favor de empresas brasileiras no exterior é chamar para mesa o exemplo do próprio Fernando Henrique, que tem o seu próprio instituto com a mesma engenharia de financiamento e que também defendeu interesses de empresas brasileiras no exterior como Ministro das Relações Exteriores ou como Presidente. Não se pode culpá-los pelo dever de ofício. Se um tinha o Delúbio, o outro tinha o Sérgio Mota. Todos são farinhas do mesmo saco. Se Lula foi conivente com a fórmula do Petrolão e do Mensalão deve ser julgado. Uma prisão midiática só sangra a credibilidade do processo.  

O importante é ver o que irá acontecer no cenário nacional e a postura da máquina eleita de forma legítima.

Dilma tem sido reconhecida pela própria oposição como pessoalmente incorruptível. A sua trajetória é de uma representante da classe média que construiu uma vida dentro de princípios morais. Hoje ela é muito mais Dilma e menos PT. Tirá-la do poder e entregar o Planalto a um negociador que irá estacar o processo de transformação. Esta investigação que há alguns anos seria impensável, não precisa de bombeiros ou de incendiários. Necessita que continue firme e forte. Doa a quem doer.

O nosso processo de amadurecimento democrático está numa etapa vital: a dos expurgos. Eles poderão abrir espaço para uma geração de excluídos de um mundo político que só se fazia possível com um caminhão de dinheiro.

Só o PSOL achou o caminho das urnas, o mesmo que foi achado pela família Bolsonaro, os opostos se atraíram na mesma fórmula representativa.

O Brasil deveria aplaudir cada condenação. Deveríamos abrir um bom espumante da Serra Gaúcha com a sentença que condene cada corrupto e corruptor.

Devemos lutar para que este processo não seja interrompido. Que estas entranhas reviradas não sejam costuradas e preservadas. Não falta cirurgião de plantão querendo salvar o rico e sórdido esquema.

Cadeia para os culpados. Cadeia para quem comprou políticos e mandatos. Cadeia para quem vendeu mandatos e garantiram o fluxo partidário como propina de obras manipuladas.

O grande erro do PT foi colocar na presidência da república uma pessoa considerada incorruptível. O PT pagará caro por isso.

Mas é exatamente essa a nossa sorte. Dilma tem a legitimidade das urnas e tem autoridade moral para comandar este processo de transformação. Foi eleita democraticamente. Ela tem garantido um processo de apuração isenta, como fez no mensalão.

Dilma precisa ser mais Dilma. Acreditar no seu encontro com a história. Punir e separar o joio do trigo.

Quem assistiu o documentário “Entreatos” de Walter Moreira Salles conhecerá o clima de quadrilha que se instalou em Brasília, no qual Dilma não aparece e saberá reconhecer que a realidade hoje é bem diferente. (Em tempo: Boa parte dos protagonistas do filme foram para a cadeia.)

Neste reflexão devemos mirar na clarividente senadora Marta Suplicy. Ela preservou a sua história, ao colocar o dedo na ferida da mesma forma que Dilma tem agora chance de fazer.   

Estamos jogando fora as conquistas de uma década de avanços sociais e distribuição de renda, por que boa parte do partido dos trabalhadores levou   “muito a sério” esta questão de distribuição, principalmente com as empreiteiras.

A Dilma tem uma tropa que pode contar e na CGU tem o ministro Valdir Simão que materializa o quadro de colaboradores que precisa convocar para construir o novo país que surgirá desta revolução judicialista.

Precisamos de servidores públicos republicanos. Competentes e incorruptíveis. Precisamos de uma classe política que represente o povo e não os milhões usados para comprar o voto do povo. Precisamos de um tribunal de contas que tenha vergonha de macular o currículo de suas funções vitalícias com negociatas. Precisamos de empresas sadias e que se estabeleçam por competência e não pela formação de cartéis ou conchavos com os contratantes. Precisamos de um judiciário apartidário e menos midiático.   Capaz de preservar o princípio de que todos são inocentes até que se prove o contrário e, principalmente, precisamos de uma mídia menos promíscua com os processos de apuração e investigação. O vazamento seletivo só demonstra um lado podre e indesejável deste processo de apuração.

O brasileiro e a sua classe média precisam compreender a importância do momento histórico que vivemos.  

O processo de igualdade social não pode ser interrompido e não podemos deixar o vácuo ocupado por populistas oportunistas, sejam televisivos ou esportivos. Uma era de Datenas e Romários seria um desastre.

O Brasil quer a mudança que começou em Brasília, a moradora do Alvorada, cada vez mais solitária, também demonstra querer um Brasil livre dos negócios escusos e podres.

Dilma é hoje um Itamar de saias. Dois mineiros incorruptíveis, criticados por não serem intelectuais geniais, porém profundamente honestos e firmes.

Itamar soube colocar o Brasil nos trilhos e foi o pai do Real e nunca se fez uma única acusação a sua hombridade. Ser honesto, com a coisa pública e consigo mesmo é neste momento um bem de primeira necessidade para a construção de um novo Brasil.

É hora de cortar na própria carne e para manter as apurações no curso e a faxina no país só alguém que esteja disposto a ocupar um lugar na história e não em uma legenda partidária.  

Assistimos um espetacular momento histórico da nossa democracia. O fim da impunidade aos poderosos e não podemos perder a chance de expurgar do Brasil esta doença que contaminou a vida parlamentar.  

Ao invés de criticar e falar em crise ou mal do Brasil devemos ter orgulho de uma república que colocou os seus anticorpos para funcionar. Passamos a ser um país no qual a lei é para todos e que as instituições funcionam.

Se colocar Dilma no planalto foi o maior erro do PT, tirá-la será o maior erro que podemos fazer. É entregar o sistema aos bombeiros da Lava-jato. Abafar está investigação é tudo que não precisamos. Quem for culpado que acerte suas contas com a justiça e depois com a história.

 

* Claudio Magnavita - jornalista

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